Vaquejada vira reduto de bets e de políticos
Sites de apostas descobrem o esporte; patrocínio de torneios e de vaqueiros seduz artistas e nomes poderosos de Brasília
As bets – nome genérico dos sites de apostas esportivas de popularidade crescente no País e que movimentam mercado bilionário – entraram forte, em 2023, em uma modalidade que mistura tradição popular do Nordeste, negociações milionárias de cavalos de raça, políticos e empresários poderosos e sob investigação. Neste ano, as casas de apostas descobriram a vaquejada.
De acordo com o jornal o Estado de São Paulo, em uma mobilização inédita, esses sites passaram a movimentar competições e leilões de animais, espaços de poder e prestígio frequentados por lideranças políticas de Brasília, como o presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e o ministro das Comunicações, Juscelino Filho. Além de artistas como o cantor Wesley Safadão, um dos maiores agitadores do setor.
O mergulho mais profundo das bets no mundo da vaquejada ocorreu no segundo semestre, quando surgiram competições patrocinadas, arena e equipes próprias. Em paralelo, as casas de apostas lidavam com fatores cruciais aos negócios: a pressão de uma Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) aberta na Câmara e a definição de uma regulamentação do setor pelo governo federal. O Senado deve votar nesta semana um projeto que cria regras e impostos.
MOBILIZAÇÃO
A tradição é importante para políticos, sobretudo os da Região Nordeste, onde as vaquejadas são mais fortes. Em 2016, o Supremo Tribunal Federal proibiu a modalidade. Contrariada, parte da classe política se movimentou para reverter o quadro com uma proposta de emenda à Constituição (PEC) que garantisse a legalidade da prática. Em 2017, o Congresso promulgou a Emenda Constitucional 96, que liberou vaquejadas e rodeios em todo o território brasileiro, tornando sem efeito a decisão do Supremo.
“De três ou quatro meses para cá, a gente tem visto a presença desse pessoal da aposta”, afirmou ao Estadão Pauluca Moura, presidente da Associação Brasileira de Vaquejada (Abvaq), entidade responsável pelas regras das competições oficiais. “Isso é muito novo para a gente, incomum na vaquejada. Preocupa um pouco, pelo que vem junto com a aposta. Ainda não sei como vai se comportar”, disse.
Além de patrocinar a principal competição de vaquejada do país, as casas promovem campeonatos com regras próprias para facilitar o entendimento de apostas. Um dos principais nomes da vaquejada, Pedro Militão disse ao Estadão que a entrada dos sites “elevou” a prática “a um patamar nunca visto”. “Temos vaqueiros com salários que a gente nunca imaginou que fosse ter. Tem eventos com premiação de R$ 500 mil, de R$ 1 milhão”, disse. “Acredito que risco (de fraude) ocorre em todos os meios. Tem risco de prédio cair, de avião cair. Em relação à combinação, se depender de mim e dos vaqueiros da Bet Favorita (patrocinadora dele), isso aí não acontece, não.”
GENÉTICA
A vaquejada surgiu há mais de cem anos, da habilidade de sertanejos na apartação de bois. Montados a cavalo, os vaqueiros cercam o animal e, pelo rabo, o colocam no chão. A tradição foi transformada em um esporte que movimenta, só com inscrições e premiações, cerca de R$ 800 milhões por ano. A força e a velocidade dos cavalos são determinantes para que os vaqueiros derrubem os bois, cada vez maiores. A genética dos cavalos da raça quarto de milha é a mais cobiçada em leilões.
O animal mais caro já negociado no Brasil foi avaliado em R$ 8,4 milhões. Se depender do poder financeiro das bets, os valores serão puxados para cima. Empresários da Pixbet e da MarjoSports, famosos sites de apostas do País, fizeram a maior oferta pública dos últimos tempos por um único cavalo: R$ 15 milhões. Eles pretendiam comprar o Dom Roxão, um dos mais lendários garanhões da raça, mas o proprietário recusou a oferta.
A MarjoSports é administrada pelo empresário Jorge Barbosa Dias, que tem negócios nos setores de construção, agropecuária, veículos e postos de gasolina. Dias foi alvo da Operação Game Over, do Ministério Público de Pernambuco, em dezembro de 2021, investigado por contravenção penal de jogos de azar e crimes de lavagem de dinheiro e de organização criminosa. A acusação foi recusada pela Justiça e o MP-PE recorre da decisão.
A empresa foi uma das primeiras a fechar contrato de publicidade com Wesley Safadão. O cantor tem participado de competições e se consolidou como um dos maiores criadores de quarto de milha do País. Safadão se tornou um elo entre políticos, criadores, outros artistas e donos de casas de apostas, que costumam se encontrar nos grandes leilões promovidos pelo cantor. O último, no mês passado, movimentou quase R$ 29 milhões.
No mesmo leilão, Edelson Gomes da Silva, um dos sócios da Bet Nacional, comprou um cavalo por R$ 800 mil e outro por R$ 200 mil. “Iniciando suas compras, ele, que é novo investidor na raça quarto de milha, nosso amigo Edelson, da Bet Nacional. Vai pra Passira, no Pernambuco”, anunciou o locutor.
Fonte: AgoraRN
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