Os conflitos armados internacionais e os seus efeitos diretos e indiretos
Por: Gláucio Tavares Costa*
O conflito armando internacional, segundo o Direito Internacional Humanitário, é o conflito entre dois ou mais Estados, independentemente de ter havido ou não uma declaração formal de guerra; a expressão também se aplica quando há a ocupação militar de parte ou de todo um território por uma força estrangeira, com ou sem resistência.
Tais conflitos armados geralmente expõem a população das áreas em disputa ou onde se travam os combates e proximidades a permanente perigo e violações dos direitos humanos e humanitários, consistentes em homicídios, torturas e/ou ataque a pessoas protegidas pelo DIH, desaparecimentos forçados, violência sexual, tomada de reféns, recrutamento forçado, maus-tratos físicos e/ou psicológicos e deslocamento forçado, migração de pessoas refugiadas, fome etc...
O Comitê Internacional da Cruz Vermelha acrescenta, a propósito, que na região afetada por conflito também tem graves consequências para as pessoas que permanecem em seus lares, já que, por exemplo, veem limitado seu acesso aos serviços médicos ou ao abastecimento de água, ou ainda educação, o que se agrava também devido às consequências da crise econômica que geralmente acompanha o estado de beligerância, com a diminuição ou supressão dos investimentos estatais nos serviços públicos. No extremo, habitantes são compelidos a se deslocarem das áreas conflituosas e perderem seus bens, causando por consequência onda de refugiados para outras regiões.
Os efeitos dos conflitos armados também são drásticos para o meio ambiente, ocasionando severo quadro de poluição: 1) Armamentos explosivos criam detritos que se espalham pelo ar e afetam a saúde. Isso desencadeia problemas respiratórios e até doenças graves; 2) Sons de sirene, explosão de bombas e mísseis causam danos à saúde tanto humana quanto dos animais. Além de consequências à audição e a concentração, esse tipo de poluição pode provocar problemas psicológicos como estresse, depressão e ansiedade; 3) A destruição da infraestrutura das cidades que sofrem com os bombardeios resultará na extração de mais recursos naturais para reconstrução. A exploração desencadeada dos recursos biológicos, hídricos, minerais e energéticos gera consequências como: extinção de espécies e alterações climáticas; 4) O conflito coloca em risco a sobrevivência de espécies uma vez que ocorre destruição de áreas agrícolas, contaminação de recursos hídricos, do solo e do ar, fundamentais à manutenção da vida; 5) Durante o conflito, uma das armas utilizadas por soldados é a contaminação de rios, mares e represas para provocar a interrupção de fornecimento de água. Esses fatores são capazes de provocar escassez dos recursos hídricos (Alves, 2022).
Pongeluppe (2022) assinala que “as consequências econômicas de um conflito armado em áreas afetadas são obviamente nefastas, dada a destruição total ou parcial da infraestrutura e do capital físico local.” Além disso, os efeitos negativos dos conflitos armados espraiam-se também por regiões não afetadas diretamente pelo confronto. Makarin, Alexei e Korovkin, Vasily (2021), no artigo “Conflito e comércio entre grupos: evidências da crise Rússia-Ucrânia de 2014”, sobre o impacto do conflito russo-ucraniano de fevereiro de 2014, quando a Rússia ocupou a região da Crimeia, ao sul da Ucrânia, portanto antes do atual situação bem mais trágica do conflito, estimaram que “o efeito indireto do conflito gerou uma perda econômica, em termos de comércio exterior, de até 1 bilhão de dólares.” De acordo com o referido estudo, o conflito reduziu a confiança e a boa-fé entre ucranianos e russos, o que, por sua vez, fez com que o comércio entre as duas nações declinasse. Arrematam que “a redução das transações econômicas e a diminuição do capital social e da confiança entre os países envolvidos são efeitos que vão além da localidade que sofre a incidência direta da contenda.”
É relevante atentar que, consoante se avalia no artigo: “Entenda quais são os efeitos psicológicos da guerra.”, a constante exposição à violência, perda de entes queridos e a instabilidade socioeconômica resultante dessas situações contribuem para um ambiente adverso que impacta diretamente o bem-estar psicológico das pessoas, provocando patologias como a ansiedade, a depressão, o trauma, o estresse emocional entre outros danos a saúde mental.
Por fim, não é supérfluo lamentar que, conforme registra Senra (2013), o mundo vem se tornando um lugar mais violento do que no começo deste século e deve chegar ao fim de 2023 com, pelo menos, oito grandes guerras, além de dezenas de conflitos armados em busca de territórios ou governos, estando em curso neste momento à guerra entre Israel e o Hamas na Faixa de Gaza, à invasão russa contra a Ucrânia, além de conflitos armados em grande escala que estão acontecendo em Burkina Faso, Somália, Sudão, Iêmen, Mianmar, Nigéria e Síria.
Referências:
1. Alves, Jéssica (2022). Quais são os impactos ambientais da guerra entre Rússia e Ucrânia? Educamaisbrasil. Recuperado de https://www.educamaisbrasil.com.br/educacao/noticias/quais-sao-os-impactos-ambientais-da-guerra-entre-russia-e-ucrania;
2. Colômbia: Consequências humanitárias do conflito armado (2010).Comitê Internacional da Cruz Vermelha. Recuperado de https://www.icrc.org/pt/doc/resources/documents/report/colombia-report-intro-220410.htm;
3. Entenda quais são os efeitos psicológicos da guerra. Afya Educação Médica. Recuperado de https://educacaomedica.afya.com.br/blog/entenda-os-efeitos-psicologicos-da-guerra?utm_source=google&utm_medium=organic;
4. Makarin, Alexei e Korovkin, Vasily (2021). Conflito e comércio entre grupos: evidências da crise Rússia-Ucrânia de 2014. Recuperado de https://papers.ssrn.com/sol3/papers.cfm?abstract_id=3397276;
5. Paz e Segurança. Centro Regional de Informação para a Europa Ocidental. Recuperado de https://unric.org/pt/paz-e-seguranca/
6. Pongeluppe, L. S. (2022). Os efeitos indiretos da guerra na Ucrânia: lições da crise de 2014. Exame. Recuperado de https://exame.com/colunistas/impacto-social/os-efeitos-indiretos-da-guerra-na-ucrania-licoes-da-crise-de-2014/;
7. Pureza, J. M. e outros (2005). Prevenção de Conflitos Armados, Cooperação para o Desenvolvimento e Integração Justa no Sistema Internacional. Faculdade de Economia da Universidade de Coimbra. Recuperado de chrome-extension://efaidnbmnnnibpcajpcglclefindmkaj/https://www.ces.uc.pt/nucleos/nep/pdfs/prevencao_conflitos.pdf;
8. Senra, Ricardo (2023). Quais são as grandes guerras em curso no mundo — e por que algumas chamam menos atenção? BBC Brasil News. Recuperado de https://www.bbc.com/portuguese/articles/c192m733912o.
9. Souza, Karla K. H. (2022). Direito internacional humanitário. Enciclopédia Jurídica da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo. Recuperado de https://enciclopediajuridica.pucsp.br/verbete/537/edicao-1/direito-internacional-humanitario
*Gláucio Tavares Costa é analista judiciário do TJRN, mestrando em Direito pela Universidad Europea del Atlántico e graduado em Farmácia pela UFRN.
Blog 30zero7