Escravocrata de usina destruidora no Pantanal é empossado secretário ambiental em Poconé (MT)
Ademir Zulli, que comandou pistoleiros contra este repórter na década de 90, é herdeiro do grupo empresarial que escravizou por duas décadas a comunidade de Chumbo, no município pantaneiro
Onome dele é Ademir Zulli, postulante a vereador ano passado e que teve a candidatura indeferida. Antes presidente da Câmara local, ele perdeu o mandato e tornou-se inelegível por cometer irregularidades no exercício do cargo. Na última quinta-feira (2), Ademir foi empossado secretário municipal do Meio Ambiente da prefeitura de Poconé, cidade mato-grossense que é o principal portal da parte norte do Pantanal. É ali que tem início, do lado de Mato Grosso, a famosa rodovia Transpantaneira que vai dar na margem esquerda do rio Paraguai, na parte de Mato Grosso do Sul. Poconé é também, junto com o vizinho Nossa Senhora do Livramento, o município com maior número de remanescentes de quilombos naquele estado.
Zulli é herdeiro de um dos maiores grupos empresariais de Mato Grosso, dono de usinas de produção de álcool e de vastas lavouras de cana-de-açúcar. Uma de suas empresas, a Alcopan, manteve por 20 anos toda a comunidade quilombola de Chumbo sob o regime de trabalho escravo.
Após uma série de denúncias da imprensa local, o Ministério Público Federal em Mato Grosso conseguiu o fechamento da usina, que além da prática do trabalho escravo, contribuía para a destruição do meio ambiente. Mas seus proprietários não foram devidamente punidos e permaneceram com suas lavouras.
Três décadas atrás, em meados dos anos 90, este repórter denunciou o Grupo Zulli pelo uso de trabalhadores nordestinos em situação de trabalho escravo. Durante a apuração, em uma fazenda na região de Cangas, em Poconé, eu e minha equipe do jornal A Gazeta, onde fui repórter e editor, fomos expulsos do local por pistoleiros comandados pelo próprio Ademir Zulli. Sob a mira de pistolas e carabinas, fomos perseguidos por alguns quilômetros, até um posto policial na confluência das rodovias MT-060 e MT-451. Para o nosso azar, os PMs, aos quais pedimos ajuda, ficaram do lado dos pistoleiros e nos obrigaram, sob a mira de armas, a entregar máquina fotográfica com o filme, gravador com fita e as anotações.
Mas antes, durante a perseguição inicial pela MT-451, pedi ao repórter-fotográfico Délcio JB para rebobinar o filme e colocar outro na máquina. De minha parte, arranquei a parte da apuração do meu bloco de notas e troquei a fita do gravador com os depoimentos dos trabalhadores. Escondi tudo no assoalho do carro da reportagem. No dia seguinte, quando a matéria foi manchetada pelo jornal, recebi a visita ameaçadora de outro capanga do Grupo Zulli, que foi prontamente expulso da Redação pelo Chicão, uma espécie de “faz-tudo” que havia no jornal, apoiado pelo “Paraíba”, o porteiro brabo da recepção matutina.
Ademir Zulli é um desses representantes de famílias de exploradores de trabalhadores quilombolas e indígenas em Poconé e em outras regiões do Pantanal mato-grossense. A exemplo dos latifundiários de outros espaços do vasto território de Mato Grosso, que detonam o Cerrado e a Amazônia e ameaçam agricultores familiares e comunidades tradicionais indígenas e quilombolas com suas armas químicas e tradicionais, parte considerável de fazendeiros pantaneiros são cruéis na exploração humana e na degradação do meio ambiente. São os responsáveis diretos pelos desmatamentos e incêndios no Pantanal, sem falar nos desvios e aterros em mananciais, o que desequilibra o ecossistema local.
São eles, de todos os cantos, latifundiários (que atendem pelo eufemístico “agronegócio”) e escravocratas, que dominam a política de Mato Grosso, um estado que, em plena terceira década do século 21, ainda impera a escravidão e a “lei do 44”.
Fonte: Expresso 61
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