Código do Consumidor ampliou campo de incidência da responsabilidade
O CDC também ampliou o campo de incidência da responsabilidade, que passou a alcançar não apenas o fornecedor diretamente ligado ao evento danoso, mas toda a cadeia produtiva envolvida na atividade de risco.
A 4ª Turma, no REsp 1.358.513, relatado pelo ministro Luis Felipe Salomão, decidiu que uma empresa engarrafadora de gás de cozinha e uma distribuidora — revendedora exclusiva da primeira — eram responsáveis solidárias por atropelamento ocorrido durante a entrega do produto, que culminou na morte de um menino de quatro anos, em 2008. A criança andava de bicicleta quando foi atingida pelo caminhão de entrega, no momento em que o motorista realizava manobra em marcha à ré.
Conforme o relator, o CDC estabelece expressamente, no artigo 34, que o fornecedor de produto ou serviço é solidariamente responsável pelos atos de seus prepostos ou representantes autônomos. “Ou seja, estabelece a existência de responsabilidade solidária de quaisquer dos integrantes da cadeia de fornecimento, que venham a dela se beneficiar, pelo descumprimento dos deveres de boa-fé, transparência, informação e confiança, independentemente, inclusive, de vínculo trabalhista ou de subordinação”, afirmou Salomão.
O superendividamento na mira das instituições
De acordo com o ministro Paulo de Tarso Sanseverino (falecido em abril de 2023), o superendividamento se tornou uma grande preocupação do direito do consumidor em todo o mundo, devido às facilidades de acesso ao crédito.
Ele foi o relator do REsp 1.584.501, no qual a 3ª Turma analisou se o desconto de empréstimo consignado poderia alcançar quase o valor total do salário do devedor. Por reconhecer que tal situação trazia risco à subsistência do consumidor, o colegiado limitou a 30% os descontos na conta em que ele recebia seus rendimentos.
A decisão da 3ª Turma foi tomada quando ainda tramitava no Congresso o projeto que viria a se transformar na Lei 14.181/2021, a chamada Lei do Superendividamento, que disciplina o crédito ao consumidor. Mesmo reconhecendo que as relações contratuais são regidas pelo princípio da autonomia privada, Sanseverino ponderou que esse princípio se submete a outros, como o da dignidade da pessoa humana.
O problema do superendividamento do consumidor tem recebido atenção especial do Poder Judiciário. Em agosto de 2022, foi lançada no Conselho Nacional de Justiça (CNJ) a Cartilha sobre o Tratamento do Superendividamento do Consumidor, elaborada por um grupo de especialistas que teve o ministro do STJ Marco Buzzi como coordenador.
Em novembro do mesmo ano, o STJ promoveu o seminário O Tratamento do Consumidor Superendividado à Luz da Lei 14.181/2021: da trajetória legislativa à sua efetivação. Na opinião do ministro Buzzi, coordenador-geral do evento, o controle do superendividamento exige não apenas a atuação do Judiciário, mas um conjunto de ações a serem desempenhadas por vários segmentos sociais e instituições em favor de uma necessária mudança de mentalidade.
Relação entre o direito do consumidor e a proteção de crédito
A relação entre direito do consumidor e proteção de crédito é uma questão frequente nos processos que chegam ao STJ. Em 2009, ao julgar os Temas 40 e 41 dos recursos repetitivos (REsp 1.062.336), a Segunda Seção discutiu a possibilidade de indenização por danos morais diante da falta da comunicação prévia ao consumidor sobre a inscrição de seu nome em cadastros restritivos de crédito — exigência do parágrafo 2º do artigo 43 do CDC —, nos casos em que exista inscrição anterior feita regularmente. O julgamento levou à edição da Súmula 385.
A corte entendeu que o dano moral é configurado quando a entidade de proteção ao crédito aponta como inadimplente alguém que efetivamente não o é. Quando a anotação é irregular, mas o consumidor tem contra si alguma inscrição legítima, não se verifica o direito à indenização, mas apenas ao cancelamento.
Recentemente, no julgamento do REsp 2.056.285, a 3ª Turma estabeleceu que a notificação do consumidor sobre a inscrição de seu nome em cadastro restritivo de crédito exige o envio de correspondência ao seu endereço, sendo vedada a notificação exclusiva por e-mail ou mensagem de texto de celular (SMS). Com informações da assessoria do STJ.
Fonte: Conjur
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